Fonte: Correio Braziliense / imagem: Washington Costa/Ascom/ME

Preocupado em reduzir a rejeição popular devido à escalada da inflação, em grande parte, por conta da alta dos preços dos combustíveis, o presidente Jair Bolsonaro (PL) pode ter dado um tiro no pé ao tentar trocar o comando da Petrobras após o último reajuste, em março. Para especialistas, o chefe do Executivo criou um problema para ele mesmo em pleno ano eleitoral e mostrou desconhecimento dos padrões de governança da estatal.

Com a desistência de dois nomes indicados a Bolsonaro pelo ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, o Planalto corre contra o tempo para conseguir outros substitutos até a próxima Assembleia Geral Ordinária (AGO), marcada para o dia 13, quando também será apreciado o balanço financeiro de 2021. Não está descartado que seja excluída da pauta a votação do novo Conselho de Administração. O mandato do atual presidente da Petrobras, Joaquim Silva e Luna, seria, portanto, estendido até a definição dos novos nomes.

A indicação de Adriano Pires — sócio e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE) — para presidir a estatal é mais uma prova dessa tentativa frustrada de Bolsonaro de interferir na empresa, segundo analistas. Eles dizem que faltou checar as indicações, feitas no afogadilho. Apesar de ser um técnico qualificado da área, Pires e o presidente do Flamengo, Rodolfo Landim, indicado para comandar o Conselho de Administração, são amigos do empresário Carlos Seabra Suarez, um dos fundadores da empreiteira OAS, que esteve no olho do escândalo do Petrolão. Essa amizade foi apontada no relatório da Diretoria de Governança e Conformidade (DGC) da estatal e tornou-se um dos motivos para que ambos desistissem da indicação antes mesmo de serem barrados na votação na AGO.

A proximidade de Pires e Landim com caciques do Centrão, como Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara; e Ciro Nogueira (PP-PI), ministro-chefe da Casa Civil, também levantou suspeitas. Landim ainda tinha uma condenação no Tribunal de Contas da União (TCU) que pesava contra a indicação, na contramão dos pré-requisitos, como conhecimento técnico e conduta ilibada. O Ministério Público junto ao TCU ainda apontou conflito de interesses na indicação de Pires antes de o economista anunciar a desistência do cargo.

“Agora, o governo vai ter de arrumar uma pessoa que atenda aos requisitos básicos da Lei das Estatais e defenda a empresa de indicação política. O mais importante é preservar a estatal das tentativas de interferências do Centrão e não destruir o que se levou tanto tempo para ser reconstruído”, afirmou a economista e advogada Elena Landau, ex-diretora do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Para ela, essa obsessão apenas em relação aos combustíveis tem deixado um problema maior, que é o aumento das tarifas de energia elétrica, cujas empresas do setor já tiveram subsídios e empréstimos bilionários que não frearam o aumento da tarifa. “O custo da conta de luz não para de crescer”, lamentou.

Enrosco

William Nozaki, coordenador técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), avaliou que “essa confusão se transformou em um tremendo enrosco para o governo, que escolheu Pires e Landim como se estivesse entregando as responsabilidades para dois grandes setores que têm se incomodado com a PPI (Preço de Paridade Internacional)”. “Landim contava com apoio de Lira e Nogueira para ter uma interlocução com a ala política, e Pires tem uma rede de relações de empresas do setor que também estavam incomodadas com a velocidade do repasse de preços dos combustíveis”, ressaltou.

Na avaliação de Nozaki, tudo isso mostrou que Bolsonaro está preocupado em tirar do colo dele o custo do aumento dos combustíveis, entregando indicações para as bases de apoio, mas ele “se colocou em uma situação desconfortável”. “A PPI tem sido um cemitério de presidentes da Petrobras”, frisou, citando os ex-dirigentes que caíram após sucessivos reajustes de preços, como Pedro Parente e Roberto Castello Branco.

De acordo com Nozaki, a AGO do dia 13 precisará ocorrer, porque foi agendada para discutir o balanço de 2021. “A questão é se Bolsonaro vai conseguir indicar novos nomes em tempo da assembleia ou estender o mandato atual até conseguir encontrar os substitutos de Pires e de Landim”, acrescentou. Para ele, esse episódio “mostrou que os instrumentos de governança da Petrobras estão funcionando em momentos delicados”.

Solução caseira fica na berlinda

Um dos nomes cogitados para presidir a Petrobras, após a desistência do economista Adriano Pires, foi o de Caio Paes de Andrade, secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia. Contudo, ele já vem sendo apontado como carta fora do baralho, porque também não cumpre os pré-requisitos previstos nas regras de governança da estatal, o que põe por terra a teoria de que o ministro da Economia, Paulo Guedes, teria recuperado prestígio na escolha do sucessor do demitido Joaquim Silva e Luna.

“Guedes vem perdendo espaço decisório para o Centrão de forma significativa. Ele ficou fora dessa decisão e tem ficado fora de decisões importantes recentes”, destacou William Nozaki, do Ineep.

Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, avaliou que a troca na Petrobras, além de deixar clara a tentativa do presidente Jair Bolsonaro de mexer na política de preços da estatal, confirma o enfraquecimento de Guedes. “Já se percebeu que tentar mexer na política de preços da Petrobras não vai funcionar. A preocupação maior do mercado são com as benesses fiscais em ano eleitoral. Aqui, o ministro parece fraco para impedir a piora desde o ano passado”, disse.

Em reunião ontem, Bolsonaro e o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, não conseguiram bater o martelo sobre os novos nomes para a cúpula da Petrobras. A tendência, segundo fontes do governo, é de que Silva e Luna permaneça no cargo até uma decisão do chefe do Executivo. “O governo está definindo os profissionais que preencham o perfil para ocupar os cargos de presidente da Petrobras e o de presidente do Conselho de Administração da empresa. Quando esses nomes forem definidos, eles serão devidamente informados”, informou o MME, em nota.

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