Fonte: EPBR / imagem: Divulgação

RIO — A Petrobras anunciou um reajuste de 8,8% no preço do diesel, a partir de terça-feira (10/5), depois de 60 dias sem mexer nos valores nas refinarias.

  • O aumento ocorre apesar de os preços do petróleo cru terem se mantido relativamente estáveis no período. A cotação do barril do tipo Brent, referência global, acumulou uma alta de 0,6% entre 10 de março, quando a estatal havia anunciado o então último reajuste, e 8 de maio, véspera do anúncio do novo aumento dos preços da petroleira brasileira — e, portanto, última referência para a mudança nos valores nas refinarias brasileiras.

Por que então, afinal, a Petrobras decidiu aumentar os preços do diesel acima da variação do petróleo, mesmo com a ajuda do câmbio em boa parte do período? A explicação está no desequilíbrio do mercado global de derivados — cujos preços, nos últimos meses, descolaram dos preços do petróleo bruto.

  • Tanto que o reajuste anunciado nesta segunda-feira (9/5) pela Petrobras foi insuficiente para eliminar a defasagem dos preços praticados pela companhia em relação ao preço de paridade de importação (PPI). A consultoria StoneX estima que, mesmo com o reajuste anunciado, a estatal ainda pratica preços 12% abaixo da referência internacional no diesel. Na gasolina, o percentual é de 8%.

A seguir, o analista sênior de óleo e gás da Bloomberg Intelligence, Fernando Valle, explica os principais motivos que justificam a alta acentuada dos preços dos derivados no mercado global e o descolamento do preço do diesel para o petróleo bruto. Em resumo, trata-se de um desbalanço na oferta e demanda:

  1. Redução da oferta: Nos últimos anos, durante a pandemia, o mercado global de refino perdeu uma capacidade de mais de 3 milhões de barris/dia, sendo a metade disso na América do Norte. Muitas refinarias fecharam, sobretudo diante das incertezas trazidas pela transição energética e a consequente falta de clareza sobre o futuro da demanda por combustíveis.
  2. Guerra na Ucrânia: As sanções aos russos mexem com o fluxo do mercado global. A União Europeia discute eliminar a compra de derivados russos até o fim do ano. Os EUA também importam diesel russo com frequência e, com os estoques em queda nos Estados Unidos, há menos combustível disponível na América do Norte para compensar uma redução do fluxo de importações da Rússia, pela Europa. Além disso, há uma limitação técnica nessa equação: nos EUA, o parque de refino está preparado para produzir, principalmente, derivados claros, como a gasolina. O país tem, portanto, limitações técnicas para aumentar as exportações de diesel para a Europa.

Perspectivas para próximos meses não são boas

Valle conta que o descolamento de preços de diesel em relação ao petróleo bruto é uma realidade do mercado global. Nos EUA, principal origem das importações brasileiras, o crack spread (a margem do refino, medida pela diferença entre o preço do derivado e o do petróleo bruto) supera os US$ 75 o barril no Golfo do México.

Na gasolina, para efeitos de comparação, a margem está na casa dos US$ 45 o barril.

Isso significa que, para o Brasil, o custo da importação de diesel americano pode superar os US$ 190 — se considerados os custos de importação.

O analista acredita que a proximidade de verão no Hemisfério Norte tende a manter o crack spread do setor pressionado no mercado global. Ele não acredita em mudanças nos fundamentos da oferta.

O patamar dos preços dos derivados, porém, vai depender de como a demanda reagirá aos altos preços. 

“Não vejo melhora nos fundamentos. A dificuldade é entender o quanto vai ser possível suportar essa alta, se haverá destruição de demanda. É a grande dúvida: o que acontece com a economia, como a demanda vai reagir?”, questiona Fernando Valle.

O que diz a Petrobras sobre aumento do diesel

Ao justificar o novo reajuste, a petroleira alegou que o último aumento do diesel, de 25% no dia 11 de março, refletiu “apenas parte da elevação observada nos preços de mercado” na ocasião — nos últimos meses, os preços dos combustíveis têm sido impactados pelos desdobramentos da guerra na Ucrânia.

A companhia justifica que o balanço global de diesel está desequilibrado. Os estoques globais estão reduzidos e abaixo das mínimas sazonais dos últimos cinco anos nas principais regiões supridoras.

“Esse desequilíbrio resultou na elevação dos preços de diesel no mundo inteiro, com a valorização deste combustível muito acima da valorização do petróleo. A diferença entre o preço do diesel e o preço do petróleo nunca esteve tão alta”, esclareceu a empresa.

Diante da escassez de diesel no mercado, a Petrobras reforçou o seu time de trading em Houston (EUA), Roterdã (Países Baixos) e em Singapura, para mitigar riscos ao abastecimento.

O preço cobrado pela Petrobras nas refinarias é o item de maior peso na composição final dos preços do diesel no mercado brasileiro. A parcela da estatal responde por cerca de 60% do preço final do derivado, de acordo com dados da própria companhia, anteriores ao reajuste anunciado nesta segunda-feira (9/5).

O primeiro reajuste da gestão Coelho

Este é o primeiro reajuste anunciado pela Petrobras sob a gestão de José Mauro Coelho. O litro do derivado vendido pela estatal às distribuidoras passará de R$ 4,51 para R$ 4,91. O valor da gasolina, por sua vez, foi mantido inalterado.

O aumento ocorre dias após pressão do presidente Jair Bolsonaro (PL) sobre a companhia.

Na quinta-feira (5/5), pouco antes de a estatal anunciar o superlucro de R$ 44,56 bilhões, relativos ao primeiro trimestre, Bolsonaro apelou à Petrobras, para que ela evite novos reajustes dos combustíveis. Segundo ele, um novo aumento no preço do diesel poderá criar uma “convulsão social” no país.

As críticas de Bolsonaro à Petrobras acontecem menos de um mês após o presidente da República trocar o comando da estatal, por insatisfação com a política de preços da petroleira. José Mauro Coelho tomou posse como presidente da empresa há 26 dias.

José Mauro Coelho é o terceiro presidente da Petrobras no governo Bolsonaro — que demitiu Roberto Castello Branco e Joaquim Silva e Luna em meio a crises desencadeadas por aumentos nos preços dos combustíveis.

A troca mais recente no comando da estatal teve como estopim o reajuste de 18,7% da gasolina e de 24,9% do diesel, válido desde 11 de março, enquanto Bolsonaro pressionava Silva e Luna a manter os preços temporariamente congelados, na expectativa de que a cotação do petróleo começasse a ceder após o pico registrado no início da guerra na Ucrânia.

A inflação dos combustíveis é um tema sensível, eleitoralmente, para o presidente da República. Bolsonaro foi apontado como o maior culpado pelos reajustes, segundo pesquisa Genial/Quaest sobre a corrida presidencial, divulgada em 7 de abril.

Uma pesquisa do PoderData, realizada de 24 a 26 de abril, mostra que 67% da população brasileira é favorável a uma intervenção do governo na Petrobras para baixar o preço da gasolina.

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