extinguem certos direitos e obrigações em suas respectivas esferas de competências técnicas regulatórias. Esses entes são, todavia, vinculados ao Poder Executivo, e, assim, por essência, não têm competência para legislar.Enquanto os atos legislativos encontram legitimidade no voto popular e têm suas balizas definidas pela Constituição Federal, os atos regulatórios possuem competência formal definida através das leis de criação dos entes reguladores e devem ser sustentados por argumentos e estudos técnicos, bem como pelos mecanismos de consulta popular (Audiências e Consultas Públicas). Se isto não ocorrer, os atos regulatórios serão inválidos, por ausência de legitimidade técnica e política.Se, no processo democrático puro, a melhor decisão é a da maioria, independentemente de ser a tecnicamente melhor, no processo decisório da regulação a melhor decisão deve ser a que se apresentar fundamentada nas melhores bases técnicas e encontrar respaldo nas audiências públicas.
No caso das agências reguladoras federais brasileiras, os mecanismos de consulta popular já são utilizados há algum tempo. Tornou-se comum que deles tomem parte os agentes econômicos ou representantes de grupos de interesse mais diretamente afetados pela regulação. A participação desses grupos de interesses se dá para atingir objetivos diversos, todos eles a priori legítimos, como ocorre em qualquer processo democrático.
Em 19 de novembro de 2013, o Ministério Público de Defesa do Consumidor de Minas Gerais, em uma bela iniciativa, realizou uma Audiência Pública para debater possíveis propostas de melhoria para o setor de Gás LP. Foram convidados diversos representantes do setor, a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), lideranças da revenda, distribuidoras, Corpo de Bombeiros e fabricantes de equipamentos ainda inexistentes no Brasil, dentre outros. Desses debates surgiram como “propostas” de inovação a criação de uma modalidade de revendedor de Gás LP “bandeira branca” e de venda de Gás LP de forma fracionada.A ANP, através de seus representantes, posicionou-se sabiamente no sentido de que as normas que regulam as atividades de Revenda e Distribuição seriam objeto de revisão ao longo do ano de 2014, mais especificamente no 2o semestre, e que, desta forma, todas as propostas de modificação poderiam ser estudadas a seu tempo.
De nossa parte, vemos nas duas propostas consequências indesejadas para os consumidores. Sem procurar ser exaustivos, destacamos, no caso dos revendedores “bandeira branca”, desvantagens potenciais para os consumidores, especialmente em relação ao pós-venda e à assistência técnica ao produto (opinião compartilhada com organismos de defesa dos consumidores que já se manifestaram nesse sentido).
No caso da venda fracionada, vemos, além de inconsistências econômicas do projeto, também um sensível aumento no potencial de fraudes, com enchimento a menor dos recipientes, bem como incentivos à venda irregular de recipientes de Gás LP, que poderiam ser enchidos total ou parcialmente em caminhões e comercializados sabe-se lá de que forma.
Como o debate levado a efeito trouxe teses e antíteses, todas baseadas em visões que praticamente desconsideravam os desejos reais dos consumidores, já que estes, mais uma vez, não estavam presentes, o Sindigás propôs-se e se comprometeu com a realização de uma pesquisa de opinião junto a uma amostra representativa de consumidores de Gás LP, analisando seus anseios, percepções sobre o serviço prestado e, sobretudo, sobre os dois conceitos propostos naquela Audiência Pública: Posto Revendedor de Gás LP “Bandeira Branca”; enchimento total ou parcial, porta a porta, dos recipientes de Gás LP.
Foi contratada uma empresa de pesquisas de grande renome no Brasil. Os conceitos foram construídos em
conjunto com os representantes da ANP. O conceito do Posto Revendedor de Gás LP “bandeira branca” é o revendedor que revende recipientes transportáveis de qualquer marca, sem ter vínculo contratual com nenhuma
delas. O projeto de enchimento total ou parcial dos recipientes transportáveis consiste, basicamente, em um veículo que circula enchendo os recipientes dos consumidores.
Os resultados da pesquisa trouxeram uma gama infinita de perspectivas e oportunidades, mas, de uma forma geral, um aspecto que pareceu muito positivo para o setor de distribuição foi o quão positivamente o consumidor percebe o serviço prestado com a entrega dos recipientes do Gás LP porta a porta e a qualidade do produto, especialmente quando comparado com outros serviços em grande escala utilizados. Curiosamente, o Gás LP fica bem à frente dos bancos, das telefônicas, das empresas de seguro e das empresas de TV por assinatura. O consumidor confirmou claramente como a
confiança, muito atrelada à marca, está relacionada no seu processo decisório, superando, em muito, fatores percebidos por muitas pessoas como prioritários, como o preço, por exemplo.
Já em relação aos conceitos testados a empresa de pesquisas adotou a sistemática de lançá-los como se fossem novos produtos/serviços. Naturalmente, a questão de ser uma novidade cria uma atratividade, mas, em ambos os casos, nos parâmetros técnicos adotados pela empresa de pesquisa, os produtos/serviços não atingiram os níveis recomendados para implementação.
Segundo a indicação dos critérios da empresa de pesquisa, o recado dado pelos consumidores foi: “Vocês podem oferecer isto, acho até legal, eventualmente posso experimentar, mas, podendo optar, não comprarei meu Gás LP desta forma”.
É claro que uma pesquisa de opinião tem sempre uma visão de marketing, disto não pretendemos nos afastar, mas, dadas as circunstâncias já citadas – os consumidores não conseguem participar efetivamente dos processos de consulta – surge um questionamento: Como deve reagir o organismo regulador? Não temos esta resposta, nem nos cabe dá-la, mas nosso entendimento é de que esta pesquisa tem grande valor cientifico. Acreditamos que, de alguma forma, trata-se de uma forma – que consideramos legítima – de se consultar o “Consumidor”, e a expressão deste, neste caso foi: “Não introduzam estas novidades, elas não nos interessam”.
Detendo-se sobre os resultados da pesquisa, verifica-se que os fatores de rejeição mais importantes, sob o ponto de vista do Consumidor, estão ligados a questões relacionadas à assistência técnica, pós-venda, garantia de qualidade, garantia de quantidade e segurança. Como o novo é sempre atrativo, há alguma tendência inicial em valorizar essas propostas, mas a rejeição está ligada aos fatores mais importantes na regulação de combustíveis: controle de qualidade, quantidade, garantia de abastecimento, segurança e rastreabilidade das responsabilidades ao longo da cadeia.
O sinal do consumidor foi dado. Ele demonstra que não tem real interesse em nenhuma dessas duas modalidades
de comercialização de Gás LP. A hora é de avaliar com profundidade outros aspectos, como os riscos e impactos econômicos a elas associados.
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