Fonte: XP / imagem: Sindigás

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Resumo

  • Diferentes leis e decisões judiciais impactaram a tributação de bens e serviços de combustíveis e energia elétrica em 2022, com impactos sobre as contas públicas dos diferentes entes e sobre a inflação;
  • Nesse sentido, algumas incertezas continuam a pairar sobre o retorno de diversas alíquotas em 2023, com destaque para a volta do PIS/Cofins sobre combustíveis e a discussão em torno do ICMS sobre gasolina e energia elétrica;
  • Consideramos que a manutenção das atuais medidas tributárias pode ter um impacto de até R$ 157 bilhões sobre a arrecadação no próximo ano. Em um cenário alternativo, com o retorno da sistemática original para a gasolina, haveria um ganho de quase 27 bilhões. Outra possibilidade é o retorno da TUSD, TUST e encargos à base de tributação da energia elétrica, o que garantiria um ganho de R$ 24 bilhões;
  • A adoção do regime monofásico para diesel e GLP, com alíquotas uniformes e por unidade (ad rem), deve resultar em ganho para os estados, já que as alíquotas definidas ficaram próximas dos valores máximos atuais. Estimamos um ganho de R$ 12 bilhões e pouco mais de R$ 2 bilhões para diesel e GLP no ano que vem;
  • Em relação à inflação, estimamos que o retorno da tributação federal teria impacto de até 51 bps sobre o IPCA do próximo ano. Já a adoção do regime monofásico acresce impacto de 5bps na inflação. Outras medidas, discutidas no cenário alternativo, poderiam chegar a elevar projeção de inflação em até 89bps.

A tributação sobre combustíveis e energia elétrica foi particularmente afetada em neste ano, com a profusão de leis e decisões judiciais que alteraram alíquotas, bases de cálculo e regimes de tributação. As principais medidas foram:

  1. Lei complementar nº 192/2022, que definiu sobre quais combustíveis incidirá o regime monofásico do ICMS, definiu a tributação específica por unidade de medida (ad rem) e uniformes em todo o território nacional, reduziu a zero as alíquotas do o PIS/Cofins sobre o diesel, GLP e querosene de aviação e definiu a base de cálculo, para fim de substituição tributária em relação às operações com diesel, como a média móvel dos preços praticados ao consumidor final (PMPF) nos 60 meses anteriores à sua fixação, essas duas últimas medidas com prazo até 31 de dezembro deste ano;
  2. Lei complementar nº 194/2022, que definiu bens e serviços relacionados a combustíveis, gás natural, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo como bens essenciais e indispensáveis, estabelecendo assim um limite às suas alíquotas de ICMS igual à alíquota modal, fixou critérios de compensação em caso de perda de receita decorrente da redução das alíquotas de ICMS e reduziu a zero, até 31 de dezembro deste ano, as alíquotas de PIS/Cofins  e Cide-Combustíveis aplicáveis à gasolina e etanol;
  3. Ação direta de inconstitucionalidade 7164-DF, na qual o ministro do Supremo Tribunal Federal André Mendonça definiu, em decisão liminar, suspender a eficácia do convênio ICMS nº 16/2022 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) e definiu como base de cálculo do imposto para os combustíveis, inclusive a gasolina, a média de preços praticados nos últimos 60 meses;
  4. Arguição de descumprimento de preceito fundamental 984-DF, na qual se instalou grupo de trabalho com representantes da União e dos estados para discutir aspectos relacionados às leis complementares nº 192/2022 e 194/2022, e no qual foi firmado acordo prevendo: i) envio ao Congresso de proposta reconhecendo Confaz como órgão legitimado para implementar monofasia e uniformidade de alíquotas, ii) reconhecimento imediato por parte do Confaz da essencialidade do Diesel, GLP e gás natural e iii) a criação criadas novas comissões para debater TUST/DUST e para estudo de possíveis compensações em caso de perda de arrecadação por parte dos estados com ICMS.

Incertezas sobre tributos federais permanecem. O governo eleito ainda não sinalizou se manterá as alíquotas de PIS/Cofins e Cide-combustíveis zeradas para o próximo ano. Para tanto, seria necessário apenas editar uma medida provisória no início do mandato, já que o orçamento de 2023 já incorpora os efeitos da desoneração, condição necessária para sua continuidade em 2023. Há possibilidade ainda de se realizar a manutenção das alíquotas por meio de decreto, já que o art. 23, §5º, da lei nº 10.864/2004, permite que o Executivo fixe coeficientes de desconto para redução das alíquotas previstas no artigo, mas apenas para aqueles submetidos ao regime especial.

Discussão de ICMS sobre combustíveis deve prosseguir no ano que vem. Consideramos que há uma grande possibilidade de que a gasolina e etanol voltem a ter uma alíquota fixada livremente, em regime plurifásico, com PMPF definido pelos estados conforme a regra anterior – média dos últimos 15 dias – ou outra menos restritiva que a definida pelo STF. Por outro lado, diesel e GLP já tiveram sua regra estipulada no âmbito do Convênio ICMS nº 199/2022 e devem migrar, a partir de abril de 2023, para um regime monofásico com alíquota ad rem uniforme em todo o país.

Definição para energia elétrica está mais distante. A retirada do TUSD/TUST ainda não foi adotada por todos os estados, que discutem judicialmente a questão há muito tempo. Não vislumbramos uma definição rápida sobre o tema, embora acreditemos que há possibilidade real de reversão da decisão tomada pelo Congresso.

Impactos Fiscais

Alterações impactaram as receitas dos entes. Para a União, a redução do PIS/Cofins e Cide-combustíveis a zero teve um impacto estimado de R$ 33 bilhões que foram mais que compensados por elevações na arrecadação de outros tributos, como IRPJ/CSLL, além de receitas de royalties e participação especial de petróleo e dividendos de estatais. Já os estados foram severamente afetados pelas mudanças no ICMS: houve queda em termos reais nas receitas de 52,4% em energia elétrica, de quase 19% em combustíveis e de 12% no total na comparação com outubro do ano passado e, no acumulado do ano, registra-se queda de 13% nas receitas advindas do ICMS sobre energia elétrica, alta de 6% em combustíveis e queda de quase 1% nas receitas totais. Note-se, contudo, que as variações são bem heterogêneas entre os estados, com aqueles que tinham alíquotas mais elevadas de ICMS sendo mais afetados.

Mudança reverteu tendência de crescimento da arrecadação. Nos últimos meses, os estados registraram queda na arrecadação de ICMS, revertendo a tendência iniciada no início do ano passado. No acumulado em 12 meses, a receita com o ICMS passou de 7% do PIB em março/2021 e atingiu um máximo de 7,7% em junho deste ano. A partir de julho, esse valor começou a se reduzir, chegando a 7,4% em outubro, refletindo o impacto das mudanças legais.

Estimamos um impacto de até R$ 152 bilhões em 2023 com as mudanças da legislação e as decisões judiciais. Considerando um crescimento das vendas de combustíveis de 5% e das receitas de energia elétrica em 10% em 2023, avaliamos um impacto de R$ 54 bilhões decorrente manutenção da desoneração de PIS/Cofins e Cide sobre combustíveis. Já no caso do ICMS, a manutenção da atual limitação de alíquotas deve produzir um impacto de R$ 55 bilhões sobre as receitas dos estados. Outras medidas, como a manutenção do PMPF de 60 dias, tem um impacto adicional de R$ 19 bilhões, enquanto a da retirada do TUSD,TUST e encargos da base de tributação de energia elétrica afetam a arrecadação em R$ 24 bilhões.

Rediscussão sobre gasolina pode trazer receitas adicionais aos estados. Se houver avanço para reconhecer a gasolina como um item não essencial, os estados poderão retornar as alíquotas aos valores anteriormente praticados. Com isso, projetamos um ganho de receita de aproximadamente R$ 20 bilhões, valor inferior às perdas estimadas por conta da manutenção de um PMPF em valores mais baixos. Adicionalmente, se houver a volta dos tributos federais sobre combustíveis, o que elevaria o PMPF – consideramos um aumento igual à alíquota cobrada e a volta da alíquota original de ICMS, teríamos um ganho adicional de R$ 6,7 bilhões. Por fim, uma solução média seria uma elevação das alíquotas, mas a valores abaixo do originalmente praticado, com média em 22%, e manutenção da dinâmica do PMPF, a qual traria um ganho relativamente menor.

Diesel e GLP devem ser afetados pela nova forma de tributação. Conforme dispôs o Convênio ICMS nº 199/2022 do Confaz, diesel e GLP devem adotar, a partir de abril de 2023, um regime monofásico de tributação com alíquotas uniformes por unidade (ad rem). As alíquotas foram definidas em R$ 0,9456/litro de diesel e biodiesel e, para GLP, em 1,2571/kg, valores em linha com os máximos praticados atualmente. A implementação dessa sistemática a partir do ano que vem deve elevar os preços do diesel e do GLP e aumentar a arrecadação dos estados, tendo em vista que hoje muitos praticam alíquotas ad valorem em patamares inferiores aos definidos. Estimamos um ganho de R$ 11,8 bilhões com diesel e de R$ 2,1 bilhões com o GLP em 2023 com a nova regra.

No caso de energia elétrica, retorno de TUSD, TUST e encargos é uma opção. Estimamos um impacto de até R$ 24 bilhões se as tarifas de uso de serviço de distribuição, transmissão e encargos voltarem à base de tributação, como estados tentam fazer. Esse ganho é inclusive superior ao retorno das alíquotas do ICMS aos seus valores praticados antes do advento da lei complementar nº 194/2022.

Consideramos apenas a volta de tributos federais em nosso cenário base. Nossas estimativas para 2023 incluem a cobrança, a partir de 1º de janeiro, das alíquotas praticadas anteriormente às leis complementares nº 192/2022 e 194/2022, sem incidência de noventena. Dito isso, é importante destacar que há graus diferentes de probabilidade de concretização desse cenário, dependendo do combustível considerado, do preço internacional do petróleo e da necessidade de se obter receitas primárias. Quanto aos estados, não consideramos nenhuma medida de arrecadação, dada a elevada incerteza que ainda cercam as discussões acerca das mudanças no ICMS.

Impactos na Inflação

Na inflação, o impacto da volta dos tributos federais tem impacto de 51bps. Esse impacto já foi incorporado ao nosso cenário base de IPCA em 5,4%. Ainda, diesel e GLP devem adotar, a partir de abril de 2023, um regime monofásico de tributação com alíquotas uniformes por unidade (ad rem), cujo impacto na inflação estimamos em 5bps (1bp em diesel e 4bps em GLP).  Outras medidas, mesmo que ainda incertes de forma geral, têm impacto altista para a inflação. Na tabela abaixo estimamos o impacto de tais medidas no IPCA do ano.

A retirada da essencialidade da gasolina, por exemplo, e retorno das alíquotas praticadas antes da Lei complementar nº 194/2022, elevariam a inflação em cerca de 5,5% (+25bps no IPCA). Alteração no mesmo sentido em etanol, GLP, energia elétrica e telecomunicações elevariam IPCA em até 2bps, 10bps, 18bps e 16bps, respectivamente.

Já a alteração da regra de PMPF tratada na Lei complementar nº 192/2022, com substituição pelo preço médio dos últimos 15 dias, chegaria a impacto de até 18bps no IPCA, sendo 13bps só devido à gasolina.

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