Fonte: EPBR / imagem: Waldemir Barreto/Agência Senado)
RIO E BRASÍLIA — O presidente eleito Lula (PT) confirmou nesta sexta (29/12) a indicação do senador Jean Paul Prates (PT/RN) para a presidência da Petrobras, a partir de 2023.
Prates encerra seu mandato no fim deste ano e integrou o gabinete de transição, no subgrupo de óleo e gás.
A seguir, a agência epbr apresenta dez pontos sobre a indicação de Prates para a Petrobras, passando pelos bastidores da escolha do nome à biografia do senador e às ideias do parlamentar para a gestão da petroleira e o setor de energia:
1. A escolha do nome
A escolha do também senador Alexandre Silveira (PSD/MG) para o comando do MME ajudou a cristalizar a indicação de Prates para a Petrobras.
Enquanto o comando da pasta passou por uma articulação que envolveu três grandes forças políticas (PSD, MDB e o União Brasil), Lula preferiu garantir um quadro do PT à frente da maior empresa sob controle da União — como fez em boa parte dos seus primeiros oito anos de governo.
Entre 2005 e 2012, a Petrobras foi presidida por José Sérgio Gabrielli, quadro histórico do partido e um dos coordenadores da campanha presidencial de Fernando Haddad, em 2018.
2. A posição contra a venda das refinarias
No Senado, o Prates foi vice-presidente da Frente em Defesa da Petrobras e uma das lideranças mais ativas em projetos na área de energia.
É crítico do programa de alienação de ativos da estatal, especialmente das refinarias. E defendeu, durante os trabalhos de transição, que a atual administração da petroleira interrompesse os desinvestimentos até a posse do novo governo.
Ponderou, no entanto, que não há como a equipe de transição paralisar processos mais avançados. E já minimizou a capacidade do novo governo de impedir os contratos fechados.
3. Prates defende revisão da estratégia da Petrobras
O relatório elaborado pelo subgrupo de óleo e gás da transição, apresentado na semana passada, propõe a criação, em 60 dias, de um plano de expansão do refino nacional [Estadão].
O senador defende também a elevação dos investimentos da Petrobras na exploração. Cita a necessidade de reposição de reservas de óleo e gás, além da diversificação do portfólio, com foco em energias renováveis e novas tecnologias.
Ao anunciar a indicação, Prates afirmou que a Petrobras precisa conciliar sua natureza de sociedade de economia mista com seu papel estruturante na economia. E reforçou que a companhia precisa olhar com mais atenção para a transição energética.
“Vejo a Petrobras como uma empresa que precisa olhar para o futuro e investir na transição energética para atender às necessidades do país, do planeta e da sociedade, além dos interesses de longo prazo de seus acionistas”, escreveu, em suas redes sociais.
4. A proposta de Prates para os preços dos combustíveis
A escolha de Prates sofreu resistências do mercado financeiro, de combustíveis e até mesmo internas.
Ele defende mudanças nas políticas para o abastecimento nacional, algumas por vias legais, além de regulatórias. Afirmou, em diferentes ocasiões, que a definição de uma política de preços no país não pode depender exclusivamente das práticas comerciais da Petrobras.
Sobre os preços dos combustíveis, tema sensível para qualquer governo, Jean Paul Prates propõe criar referências regionais, que levem em conta a formação de preços nacionais e importados. Não se trataria de tabelamento de preços dos combustíveis, segundo o senador.
“Não é tabelamento [de preços]. A proposta – que ainda tem que ser trabalhada pelo governo como um todo – é de preço de referência”, afirmou Prates ao político epbr, serviço exclusivo para empresas da agência epbr, logo após a vitória de Lula no segundo turno.
Não está claro, contudo, qual será o comando no curto prazo. As pressões inflacionárias globais persistem e o governo Lula precisa decidir se vai executar os mais de R$ 50 bilhões necessários para manter a desoneração dos impostos federais em vigor até 31 de dezembro de 2022.
Terá que lidar também com o aumento da alíquota de ICMS, em curso nos estados.
Atuação da ANP e do Cade
A ideia é que a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) seja responsável pelo cálculo dessas referências regionais de preços. Prates defende que assim será possível capturar as eficiências locais que compõem o custo doméstico e de importação.
Teria abrangência, portanto, em regiões atendidas por refinarias privadas.
“É justamente para mostrar ao mercado uma referência de preço que pode ou não ser praticada em cada área de influência de cada refinaria (privada ou pública)”, afirma.
Passaria a existir um indicador com a chancela do órgão regulador. Deixaria de ser apenas um valor “de mercado”, diz.
“Hoje o que é o tal PPI? Onde é publicado? É uma abstração! Na verdade, estamos praticando preços que os importadores impõem, sendo que eles só representam 15% a 25% de determinados mercados e determinados produtos”, critica Prates.
“Isso permitiria ações mais pontuais do Cade, inclusive. Hoje, se baseiam em achismos”, defende. “Não é [uma proposta] contra ‘international pricing‘ e sim contra a paridade de importação”.
O PPI e a venda das refinarias
O PPI (preço de paridade de importação) foi instituído na Petrobras por Pedro Parente, no governo de Michel Temer, e aplicado de forma claudicante ao longo dos quatro anos de Bolsonaro.
No papel, visava, principalmente, a criar o ambiente de negócios necessário para a venda das refinarias, abrindo também espaço para a competição de importadores e, assim, fomentar a atração de investimentos em infraestrutura por terceiros, reduzindo a dependência do mercado brasileiro da Petrobras.
O PT tem outro projeto para a companhia, manifestado na campanha e no próprio relatório da transição de governo. Além de posicionar a Petrobras como uma ferramenta de indução do desenvolvimento econômico, o partido critica o Abastece Brasil e as políticas de desregulamentação do setor de combustíveis.
5. Uma nova chance para o fundo de estabilização?
A proteção dos consumidores seria amplificada pela criação da conta de controle de volatilidades. O Senado Federal aprovou este ano, sob relatoria de Jean Paul Prates (PT/RN), um projeto que criava essa espécie de fundo.
Na sua versão original, o projeto taxava de forma progressiva as exportações de óleo, com a justificativa de criar uma fonte adicional de arrecadação quando os preços estiverem em alta e, no longo prazo, estimular o refino doméstico.
A taxa caiu; Jean Paul Prates retirou a medida de seu relatório e, nos bastidores, concordou que não seria adequado sobretaxar exportações de óleo. O fundo foi engavetado na Câmara pelo governo Bolsonaro, por iniciativa de Paulo Guedes e Arthur Lira.
6. A briga pelos dividendos da Petrobras
Do mercado de ações, uma questão-chave é a política de dividendos.
Lula, Prates e diversos membros do partido entendem que a companhia não pode se resumir ao papel de uma ‘vaca leiteira’ de dividendos e precisa voltar a elevar os investimentos na produção nacional de óleo e gás, mas também de derivados, geração de energia e ampliar o portfólio de projetos de geração renováveis.
Prates já sinalizou que o novo conselho de administração da estatal, a ser indicado no governo Lula, mudará a política de dividendos da empresa — que deve alçar a petroleira brasileira ao posto de segunda maior pagadora de proventos do mundo, segundo a gestora Janus Henderson.
Desde o governo de Michel Temer, a Petrobras deu uma guinada, com foco na região Sudeste, onde estão os campos do pré-sal, e com projetos de refino, gás e energia associados – a exemplo do polo Gaslub, no Rio de Janeiro.
Essa estratégia passou pela tentativa de vender seis refinarias de grande porte, tendo liquidado duas, a da Bahia e de Manaus.
Na descarbonização do portfólio de projetos, ficou principalmente em duas frentes: reduzir as emissões associadas à produção de óleo e derivados; e investir no diesel R.
7. Biorrefino, gás natural e indústria
O senador se posicionou recentemente também sobre outros temas do setor: defendeu a elevação da mistura de biodiesel, mas com a manutenção da abertura do mercado para outras rotas tecnológicas — o que inclui o coprocessado da Petrobras, batizado de diesel R.
A disputa no mercado de diesel tende a ser um dos primeiros temas a serem enfrentados pelo novo governo. O senador Carlos Fávaro (PSD/MT), novo ministro da Agricultura, garantiu que o governo Lula vai retomar a elevação da mistura obrigatória de biodiesel para até 15% — patamar originalmente previsto para 2023.
O governo Bolsonaro se antecipou e aprovou no CNPE a manutenção de 10% no primeiro trimestre de 2023, mas incluiu a abertura da mistura para combustíveis alternativos, entre eles o diesel R — portanto, uma medida de interesse da Petrobras. No fim, Bolsonaro recuou e a decisão fica para o governo Lula.
Gás natural na transição energética
Recentemente, Jean Paul Prates defendeu “trazer o conceito de sustentabilidade para dentro da transição com o gás natural”, durante participação em evento na COP27, no Egito.
“Com o GNL [gás natural liquefeito], por exemplo, [que] é um mercado bastante inflacionado, mas nós podemos criar um GNL de cabotagem que seja mais ameno para nós e produzir GLP [o gás de cozinha], que é um substituto da lenha”, afirmou. “É melhor GLP ou lenha?”.
O senador também defendeu o gás natural como alternativa para reduzir as emissões do transporte, deslocando o consumo de diesel, por exemplo. E como matéria-prima para petroquímica e fertilizantes.
Líder da Minoria no Senado, Jean Paul Prates foi oposição à MP da privatização da Eletrobras, mas também tem um histórico de enfrentamento na casa a emendas para térmicas e gasodutos. Foi contra a contratação compulsória das térmicas inflexíveis, que passou na lei da privatização.
Ele participou da derrubada de medidas do tipo quando a Lei do Gás tramitou no Senado.
8. As propostas de Jean Paul Prates no Senado
É autor de uma série de projetos de lei para o setor de energia, dentre os quais:
- A conta de estabilização de preços dos combustíveis (PL 1472/2021), um projeto aprovado no Senado com apoio do governo em 2022, mas posteriormente barrado por iniciativa de Paulo Guedes;
- Foi relator do que viria a ser a lei complementar 192/2022, que após uma fase de judicialização no Supremo Tribunal Federal (STF) serviu ao governo Bolsonaro como um dos pacotes para reduzir os preços, especialmente, da gasolina às vésperas da eleição.
- O marco legal da geração eólica offshore (PL 576/2021), aprovado no Senado, em parceria com o líder do governo, Carlos Portinho (PL/RJ);
- O marco para hidrogênio (PL 725/2022);
- E o marco para o armazenamento de carbono (PL 1425/2022).
9. Um quadro ‘moderado’ do PT
Jean Paul Prates tem um histórico de atuação no setor de energia. Ele é advogado e economista, com mestrado em Planejamento Energético e Gestão Ambiental pela Universidade da Pennsylvania, nos EUA, e em Economia de Petróleo e Motores, pelo Instituto Francês do Petróleo.
Sua escolha para a Petrobras contou com apoio da Federação Única dos Petroleiros (FUP), mas sofreu resistência da Associação dos Engenheiros da Petrobras (Aepet).
Em novembro, o vice-presidente da Aepet, Felipe Coutinho, chegou a escrever um artigo afirmando que no primeiro governo Lula, Prates foi um crítico da política de conteúdo local e da Lei da Partilha – e que, na década de 1990, chegou a defender a privatização da petroleira.
Jean Paul Prates foi assessor jurídico da Petrobras Internacional (Braspetro), entre 1988 e 1991, e atuou, entre 1997 e 1998, como consultor do Ministério de Minas e Energia (MME) e da ANP – período no qual foram aprovadas a Lei do Petróleo e instituída a Rodada Zero, no governo de Fernando Henrique Cardoso.
Na política, antes de ser senador, foi secretário de Energia do Rio Grande do Norte, entre 2008 e 2010, no governo Wilma de Faria – período marcado pela expansão da energia eólica e solar no estado.
Em 2014, foi eleito primeiro suplente da senadora Fátima Bezerra (PT/RN) e assumiu a cadeira no Senado em 2019, quando Bezerra se tornou governadora.
10. A Lei das Estatais em debate
A Lei das Estatais, de 2016, veda, para o comando de empresas públicas, pessoa que, nos últimos 36 meses, participou de “estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado à organização, estruturação e realização de campanha eleitoral”.
O PT entende que não se aplica ao caso de Prates e que há precedentes no próprio governo atual, quando houve a nomeação de Fábio Abrahão para o BNDES, após o executivo atuar na campanha de Bolsonaro, na elaboração de propostas para o próximo governo.
Este mês, a Câmara dos Deputados aprovou uma alteração na lei, reduzindo o período de quarentena de três anos para 30 dias. O texto seguiu para o Senado, e pode ser, eventualmente, votado em 2023.