Fonte: Petróleo Hoje / imagem: Pexels

Indagado certa vez sobre a importância da manutenção do PPI para garantir os fluxos de importação dos derivados de petróleo, Prates foi categórico ao dizer que “não é o rabo que abana o cachorro”. Em outras palavras: se o Brasil produz cerca de 75% do diesel que consome, não faz sentido a parcela minoritária do estrangeiro reger a dinâmica interna de preços ao sabor das flutuações do mercado internacional.

Pode-se dizer que a abordagem tem lógica e até um senso “democrático”. Sobretudo se pensarmos que o PPI ‘penaliza’ o bolso do cidadão comum e os indicadores econômicos enquanto preserva o caixa da Petrobras – cujo maior acionista individual é, em última instância, a própria sociedade brasileira -, favorecendo a posição de importadores que auferem ganhos como se fossem detentores de refinarias no país.

Mas se não é o rabo que abana o cachorro, como disse Prates, amputar o rabo dele – ou, se preferir, alijar os importadores do mercado – vai equacionar a “sinuca de bico” do abastecimento nacional?

Em sua gênese, a Petrobras foi imbuída da missão de garantir o abastecimento nacional. Hoje, a atribuição pertence ao regulador, a ANP. Mas enquanto a agência tem a caneta, é a estatal que tem a tinta. Esta serve a dois senhores que disputam força num cabo de guerra: o estado, que deveria ter uma visão estratégica mas que é solapada pelos interesses da ocasião, e o acionista privado, que é imediatista e puramente financista.

Diante disso, a estratégia da petroleira em defender com unhas e dentes a sua política comercial, disputando palmo a palmo cada m³, não pode “ferir de morte” seus concorrentes. Do contrário, a estatal, que exerce o papel de “régua do mercado”, terá novamente de assumir a responsabilidade pelo abastecimento do mercado doméstico, algo que já não lhe pertence mais – seja por força de lei, seja por forças de mercado.

É, afinal, intenção dela realizar o esforço adicional de suprir a lacuna doméstica? Se sim, a que preço? Está disposta, portanto, a contorcer o seu caixa, seus acionistas e suas regras de governança para “abrasileirar” as importações? Pretende erigir novas refinarias como fez no passado, mas agora em meio à transição energética? Ou a estratégia é estrangular os investidores que adquiriram algumas de suas refinarias para recomprá-las?

Historicamente, a Petrobras fez por merecer sua posição dominante. Ela não pode ser acusada de vilã e, por isso, ser obrigada a repartir o bolo com quem chegou atrasado(a) na festa. Mas as contradições existentes no cerne deste modelo estão sendo contestadas cada vez mais pela inexorável realidade econômica.

Antes mesmo de assumir o comando da empresa, Prates mirava sua artilharia na PPI. Sentado na cadeira, contudo, adotou um “PPI envergonhado” – sem abandoná-lo na prática, tenta equilibrar os humores do governo e do mercado. O resultado: com o petróleo na casa dos US$ 90, algumas regiões do país, como o centro-oeste, já começam a experimentar riscos pontuais de desabastecimento.

De quem é a culpa? Certamente não é dos importadores. Eles não podem ser acusados de rasgar dinheiro. Ninguém em sã consciência o faria. Mas será que a ANP e o Cade estão fiscalizando o mercado com o devido rigor? O Cade, que outrora pôs a Petrobras de joelhos, parece agora estar ajoelhado às conveniências. O órgão de controle parece não controlar mais nada após ter saído de fininho da cena política após o 1º de janeiro.

E a Petrobras? Cobrada a agir como uma empresa privada sem sê-la, “lava as mãos” como se não fizesse parte do problema (e da solução). Finge ignorar sua condição de “leviatã do mercado” e o imenso poder de influência sobre o comportamento dos demais agentes. Mas se ela não supre toda a oferta doméstica, não parece ser uma boa ideia fechar a janela e escantear os importadores.

Como já disse Prates, “cada um cuida do seu negócio”. Mas quem cuida do abastecimento nacional?

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